Thursday, February 02, 2006

Procuraste-me como a um albúm de fotografias.

Escondido na gaveta funda da tua lembrança puxaste-me para fora, limpaste-me o pó, abanaste-me um pouco e ainda sopraste como que para tirar os restinhos de poeira fina (deixa dedadas, suja as mãos e a razão).

Folheaste-me lentamente, absorvendo pouco a pouco as cores esbatidas de um retrato de outrora, relembrando o espaço, o tempo e a circunstância que fizera parte daquele passado.

Voltavas atrás de vez em quando - Ah pois foi! Bem me lembro. E... - E continuavas a puxar lustro às folhas de papel transparente que faziam parte da tua História.

Mais uma. Mais outra... e aquela que nem tu nem eu faziamos ideia que tinha ficado retida em papel lustroso mental.

- Que tempos foram - dizias - roubando adjectivos às frases mas não conseguindo esconder o sorriso de mim.

Aquele olhar profundo, fixado num ponto luminoso de uma memória partilhada, o exercício daquela parte da mente que há muito enferrujara, banhada em lágrimas há muito esquecidas, abafada por pensamentos que arrastam o ácido de muitos anos.

- Deliciosos - Respondi-te com a violência de uma palavra palpável, fora do ambito étereo que é o pensamento, a puxar para os sentidos e o sentir, dignas de acompanhar o frio que sentia nas mãos. E o calor que lembrava do coração.

Entretanto o tempo voa. Temos de ir. Senão... o trânsito... o jantar... o amanhã que me tenho de levantar cedo... E assim se fecha o álbum de fotografias. Lentamente. Com uma palmadinha na capa (agora) limpa.

E foste.

Fiquei a descoberto. Cá fora da minha gaveta. Sentado a sentir o pó a assentar.

2 comments:

Luna said...

E o tempo vai passando, as lembranças ficam guardadas na gaveta, só quando já não doi se deve limpar o pó da existência

nuno said...

quem não gosta de um livro que de tão velho as fotos já amareleceram?
do inigualavel toque quando se reabre para ver o verso da Kapa, pela 1º vez em muitos anos

o pó que cai sobre o album dá-lhe uma nova vida, não concordas?